quinta-feira, 1 de março de 2007

Vento

A tua comprida saia vermelho-escarlate ondula leve e silenciosamente e parece chamar-me.

***

As folhas caídas das árvores rodopiam no chão antes de se elevarem um pouco para uma queda indolor, visto estarem já mortas e sem qualquer possibilidade de renascer; o seu castanho-acobreado, outrora verde-vivo, permanece intacto, tal como a sua estrutura estelar. Cai-te uma aos pés. Curvas-te para apanhá-la (e reparo na tua triste face, onde uma lágrima teimosa contorna o teu gracioso nariz).
Agitas a folha na tua mão e pensas que ela podia voar (estou certo disso); mas não voa. Novamente, uma brisa agita a tua saia. Desta vez, foco o ondular do teu cabelo, acompanhado pela folha castanha-acobreada. Agitam-se cada vez mais, de uma forma algo irregular. Largas a folha, que inicia a sua violenta queda, do cume ao sopé da falésia. Perco-a de vista, tal como tu.
Nisto, voltas-te para trás enquanto ajeitas o cabelo e, ainda que apenas por instantes, fixas o teu olhar no meu. Nunca imaginei poder ver o negro dos teus olhos ternos...
Uma nova rajada leva consigo o momento que guardarei para todo o sempre na minha memória (pois dizem não ter coração). Olhas para baixo, agora; fixas a biqueira dos sapatos, ansiosa, esperando por um qualquer acontecimento que te roube ao transe em que entraste voluntariamente.
Levanto-me. Caminho controlada e calmamente na tua direcção, enfrentando a mesma brisa fria que nos uniu por instantes (antes de nos separar), para te tocar no ombro fino e delicado. Aproximo a minha mão compassadamente mas, como que antecipando a minha chegada, a tua mão sobe o teu peito e toca o ombro e a ponta dos meus dedos trémulos.
Agora sinto o vento que me gela o peito; é a isto que chamam Amor.

2 comentários:

jo disse...

a beleza da escrita toda aqui reside.
beijo

Joana disse...

Gosto!
no fim de tudo, e que disseste o que tanto falaste, Amor!!!
beijinhos